terça-feira, novembro 28, 2006

Texto do Antonio Couto

O texto do Antonio. Em breve: as fotos da semana Acadêmica e os textos do Cesar Schirmer e Fernando Fleck.
Abraços!
p.s.: as notas encontram-se no fim do artigo.

Questões Disputadas – Antonio Augusto Caldasso Couto
21 de novembro de 2006.

Tensão e harmonia entre teologia negativa e teologia positiva na Suma Teológica de Sto. Tomás de Aquino


Esse artigo tem como ponto de partida a percepção de uma aparente inconsistência na teologia de Sto. Tomás, ao constatar uma tensão entre as declarações iniciais de Sto. Tomás nas aberturas das questões 2-3 da 1ª parte da Suma Teológica (ST) e a sua exposição acerca dos nomes divinos na questão 13, também da 1ª parte da ST. Nas aberturas das questões 2-3, Sto Tomás faz declarações epistemológicas que, aparentemente, deveriam comprometê-lo, com uma teologia exclusivamente negativa, i.e., com uma teologia capaz apenas de conhecer e dizer que Deus é e o que ele não é, mas não capaz de conhecer e dizer o que ele é: “Conhecida a existência de algo, falta investigar como é, a fim de saber o que ele é. Mas como de Deus só podemos saber o que Ele não é, e não o que é, não se trata tanto de considerar como Ele é, quanto como não é”. (ST, I, q3)

No entanto, na questão 13, Sto. Tomás argumenta a favor da possibilidade de predicar-se “certos nomes” de modo afirmativo e substancialmente de Deus, dando curso à fundamentação da possibilidade de um discurso teológico positivo acerca de Deus: “... nomes atribuídos a Deus de maneira absoluta e afirmativa (...) significam a substância divina e são atribuídos a Deus substancialmente”. (ST, I, q.13, a.1)

A primeira citação mencionada faz referência às duas questões centrais da teologia, a questão de saber se deus existe e a questão de saber o que deus é. aquino responde à primeira questão demonstrando a existência de deus e à segunda demonstrando alguns de seus atributos. São demonstrações[1] que remontam do efeito a causa, i.e., que partindo do que é mais conhecido para nós, a saber, as criaturas, consideradas como efeitos de Deus, chegam até a consideração daquilo que, apesar de mais inteligível em si mesmo, é menos inteligível para nós, a saber, a causa primeira ou Deus. A questão acerca da existência de deus – apesar da polêmica em torno da validade de certos princípios pressupostos em suas provas e da unidade de suas conclusões - não apresenta uma aparente ambigüidade no núcleo de sua resposta: existe uma causa primeira e universal que possui algumas características peculiares àquilo que se entende por Deus. No entanto, na resposta acerca de qual é a natureza dessa causa primeira universal, encontra-se a aparente inconsistência apontada anteriormente, pois, Sto.Tomás, a esse respeito, afirma três coisas, duas na ordem do conhecer e outra na ordem do dizer, que podem, à primeira vista, parecer incompatíveis entre si, a saber: que não podemos conhecer o que deus é, mas antes o que ele não é; que podemos conhecê-lo a partir das criaturas; e que podemos significá-lo positiva e substancialmente. A aparente incompatibilidade se torna manifesta quando levamos em consideração que, no artigo 1 da questão 13, Sto. Tomás adotou o princípio epistemológico-semântico de que só “podemos nomear alguma coisa conforme nosso intelecto a pode conhecer[2]”. Ora se não podemos conhecer o que Deus é, mas antes o que ele não é, e se conhecer Deus a partir das criaturas não é conhecer o que ele é, como então poderíamos nomeá-lo positiva e substancialmente?
Poderíamos pensar que se não podemos conhecer o que Deus é, então, quando o conhecemos a partir das criaturas, conhecemos apenas o que ele não é, mas este não pode ser o caso, pois antes mesmo de chegar às questões 12-13, que tratam do modo de conhecer e nomear Deus, Sto. Tomás já demonstrara alguns atributos positivos de Deus, como e.g., bondade e perfeição. Poderíamos, então, pensar que esses atributos não se referem à essência de Deus, no entanto, S.Tomás, na questão 13, não apenas afirma que alguns nomes se predicam positiva e substancialmente de Deus, mas também refuta a posição de certos teólogos que pretenderam reduzir o significado dos nomes divinos a uma interpretação negativa ou a uma interpretação causal, aparentemente as duas maneiras de se nomear Deus sem que se pretenda atribuir algo positivamente à essência divina.
Na busca de entender como essas afirmações podem se harmonizar, passamos inicialmente a considerar aquilo que, metaforicamente, podemos chamar de abismo onto-gnosiológico entre o Criador e a criatura, querendo expressar, por meio dessa metáfora, a existência de uma distinção radical entre Deus e seus efeitos criados, no que diz respeito tanto aos seus modos de ser quanto de conhecer. A distinção, que queremos expressar por meio do termo “abismo” é radical porque a natureza divina é simples, infinita e independente, sendo Deus o único ser cuja natureza é idêntica a sua existência, enquanto a natureza criada é finita e passível de diversos tipos de composição, devendo possuir, no mínimo, a composição entre essência e existência[3], pois toda criatura depende do Ser Divino, tanto para ganhar existência, quanto para continuar a existir. Contudo, essa metáfora por nós utilizada, deve ser interpretada com cuidado, pois a distinção que visamos com ela expressar, apesar de radical, não deve ser entendida em sentido absoluto, como a metáfora do abismo poderia sugerir, pois não há somente diferenças, mas há também similitudes, ainda que remotas, entre o Criador e criatura. Se tal abismo fosse absoluto, i.e., se não houvesse nenhuma similitude entre a Causa Divina e seus efeitos, somente poderíamos, a partir das criaturas, dizer de Deus que Ele é, e o que Ele não é, i.e., afirmar que Ele é causa da existência do mundo e negar que o seu modo de ser fosse igual ou semelhante aos modos de ser dos seus efeitos criados. Mas o princípio de causalidade - o qual não admite a existência de uma causalidade completamente equívoca[4] - aliado à máxima perfeição Divina, exige que todas as perfeições criadas pré-existam em Deus de modo eminente, o que implica na existência de similitudes entre o Criador e a criatura. Assim, a metáfora do abismo onto-gnosiológico aponta, por um lado, para a impossibilidade de termos acesso à essência divina, já que o ser divino se encontra acima de todos os gêneros lógicos e de todas as categorias metafísicas, de modo que nos é impossível conhecer o que Deus é, e expressar tal conhecimento em uma definição, mas, por outro lado, aponta para a possibilidade de conhecermos positivamente algo acerca de Deus por meio da apreensão das remotas similitudes que as criaturas mantêm com o Criador.
Após assinalar a existência do abismo onto-gnosiológico entre Deus e as criaturas, devemos considerar os modos com que os entes racionais podem obter conhecimento de Deus, i.e., os modos com que cada gênero de ser intelectual pode, por assim dizer, cruzar tal abismo. Os diversos tipos de entes encontram-se distribuídos em uma hierarquia onto-gnosiológica, que estabelece um paralelismo entre o grau de ser e o grau da capacidade cognitiva de cada gênero de ente, de tal modo que um ente só pode naturalmente obter conhecimento qüididativo[5] de entes que lhe sejam co-naturais e isto de acordo com o seu modo próprio de conhecer. Assim, um ente não possui, naturalmente, capacidade cognitiva para receber a forma ou espécie de um ser que lhe seja ontologicamente superior, mas pode receber a forma ou espécie de um ente que lhe seja co-natural[6], o qual passa a ser conhecido de acordo com o modo de conhecer do sujeito cognoscente. Assim, os seres racionais corpóreos podem naturalmente conhecer a qüididade dos seres corpóreos e os seres puramente espirituais, ou anjos, podem naturalmente conhecer a qüididade não só dos seres espirituais, mas também dos corpóreos. Como Deus se encontra no cume dessa hierarquia onto-gnosiológica, sendo o único ser que é maximamente ser, maximamente inteligível e maximamente cognoscente, Ele é o único ser que pode naturalmente apreender a sua própria essência e possuir um conhecimento compreensivo de si mesmo e de todas as criaturas por Ele criadas. Os anjos e os homens precisam ser sobrenaturalmente elevados pela graça divina, para obterem um conhecimento qüididativo, embora nunca compreensivo, de Deus. Contudo, os anjos e os homens possuem distintos modos de naturalmente obter um conhecimento imperfeito de Deus, embora não qüididativo. Os anjos dispõem de um conhecimento infuso de Deus por meio de uma imperfeita similitude, ou idéia de Deus, implantada naturalmente no intelecto angélico, enquanto os homens podem, com os recursos da razão natural, apenas obter um conhecimento, ainda mais imperfeito de Deus, a partir das similitudes apreendidas nas criaturas.
Na questão 12, que trata do modo humano de conhecer Deus, fica claro que, quando Sto. Tomás diz que não podemos conhecer o que Deus é, está simplesmente dizendo que não podemos naturalmente ter uma apreensão da essência ou forma divina nesta vida, de modo que pudéssemos expressar a qüididade divina em uma definição, pois não podemos naturalmente ter um conhecimento qüididativo de Deus, nem por uma apreensão direta da essência divina, nem por inferência a partir da apreensão de seus efeitos, uma vez que a causalidade divina não é unívoca. No entanto, como a causalidade divina também não é completamente equívoca, podemos - valendo-nos apenas dos recursos da razão natural – apreender o modo deficiente com que as perfeições criadas representam Deus e, dessa forma, por meio do criado, podemos, de modo indireto e por inferência, conhecer imperfeitamente algo acerca do Criador. Parafraseando S. Paulo, no versículo 13 de sua 1a epístola aos Coríntios, podemos dizer que, embora não possamos naturalmente obter uma visão face a face de Deus, pois não podemos, por assim dizer, cruzar com nossos próprios recursos o abismo onto-gnosiológico, podemos, contando apenas com a razão natural, conhecê-lo a partir das criaturas, em uma visão como que por um espelho, pois as criaturas, na medida em que são efeitos de Deus, são capazes de refletir, ainda que imperfeitamente, algo acerca da Causa Divina que as produziu.
Sto. Tomás apresenta três vias, assimiladas de Pseudo-Dionísio Areopagita[7] e conhecidas como triplex via, por meio das quais o homem pode extrair a partir das criaturas um conhecimento acerca de Deus e significá-lo por nomes: a via da causalidade, a via da negação e a via da eminência. A via da causalidade diz respeito à pressuposição básica de qualquer demonstração acerca de Deus, a saber, o principio de causalidade, pois é por meio da consideração de Deus como causa primeira universal e de todas as criaturas como sendo seus efeitos, que se pode demonstrar a existência de Deus e também algo acerca da natureza divina a partir das criaturas. A via da remoção pode ter uma dupla aplicação, a saber, uma aplicação meramente negativa em que se nega a presença de imperfeições em Deus, e uma aplicação a serviço da via da eminência, na qual se nega, do conteúdo inteligível de uma atribuição positiva, o modo limitado com que uma perfeição é participada pela criatura. A via da eminência, por sua vez, supõe tanto a via da causalidade, na medida em que a causalidade divina permite a existência de similitudes entre o Criador e a criatura, quanto à via negativa, na medida em que necessita das operações de purificação, gnosiológica e semântica, efetuadas pela via +negativa, quando a serviço da via da eminência.
A atribuição ou predicação de nomes divinos, a partir das criaturas, enfrenta alguns problemas concernentes a sua possibilidade quando se considera que a natureza divina é una, simples e infinita, e que somos naturalmente aptos a conhecer apenas as perfeições que nos são co-naturais, de tal modo que as perfeições que apreendemos no mundo são efeitos compostos, múltiplos e finitos que pré-existem, de modo uno, simples e infinito, na natureza da Causa Divina. O juízo predicativo, por meio do qual efetuamos atribuições, envolve dois tipos de composição, a composição entre predicados, e a composição entre sujeito e predicado, mas sabemos que Deus é uno e simples. E também os nomes que atribuímos a Deus são originalmente cunhados para significar coisas pertencentes ao mundo criado e possuem uma significação ordinária limitada pela concepção que formamos das perfeições segundo o modo deficiente com que são participadas pelas criaturas, mas sabemos que a perfeição de Deus é eminente e plena.
Diante desses problemas alguns[8] teólogos pretenderam reduzir a significação dos nomes divinos a uma interpretação causal ou a uma interpretação negativa. Segundo alguns, todos os nomes divinos deveriam ser interpretados como significando apenas que Deus é causa de tal e tal perfeição, sem que tais perfeições fossem atribuídas a Deus, significando, assim, apenas que Deus é causa. Segundo outros, todos os nomes divinos, deveriam ser interpretados negativamente, como significando a ausência em Deus de uma imperfeição ou privação, significando, assim, apenas o que Deus não é. Sto. Tomás recusa essas interpretações reducionistas e defende que certos nomes se dizem afirmativa e substancialmente de Deus.
A justificativa de Sto. Tomás para mostrar como é possível que, na atribuição dos nomes divinos, o juízo predicativo não transporte composição, e que a atribuição de perfeições não implique no modo deficiente com que as perfeições são participadas pelas criaturas, ocorre por meio do uso combinado da triplex via, pela distinção entre o modo de significar (modus significandi) e a coisa significada (res significata), assim como pelo desenvolvimento de uma teoria da analogia.
Segundo Sto. Tomás, assim como o conhecer pressupõe o ser, e uma coisa é conhecida ao modo daquele que conhece, sem que este modo de conhecer seja atribuído ao que é conhecido, assim também o nomear pressupõe o conhecer, e uma coisa é nomeada de acordo com o modo com que é conhecida, sem que, no entanto, o modo de significar, derivado do modo de conhecer, seja atribuído àquilo que é significado. Assim, a multiplicidade e a composição são inerentes ao nosso modo de significar, pois uma coisa é conhecida e significada de acordo com o modo do sujeito que a conhece, e nós conhecemos Deus a partir das diversas noções sob as quais apreendemos seus múltiplos efeitos e articulamos tal conhecimento por meio de juízos proposicionais que estabelecem uma composição entre sujeito e predicado. No entanto, apesar de conhecermos Deus em um modo diferente do modo com que ele é, não conhecemos erroneamente o modo com que Ele é, pois conhecemos de modo múltiplo e composto que Deus é simples e uno, e assim também, embora nosso modo de significar envolva composição e multiplicidade, aquilo que esta sendo significado pelo nome divino não é múltiplo nem composto.
Quanto à significação dos nomes divinos, Sto. Tomás distingue entre os nomes que significam a negação de uma imperfeição em Deus, e que possuem uma significação meramente negativa, os nomes que significam perfeições[9] cujas noções implicam o modo de ser participado das criaturas, os quais possuem uma significação metafórica, e os nomes que se dizem positiva e substancialmente, os quais são ditos literalmente e propriamente de Deus e que significam perfeições puras. A predicação afirmativa e substancial de um nome divino envolve uma aplicação da triplex via. A via da causalidade está presente na medida em que a perfeição pura que esta se atribuindo a Deus é uma similitude que as criaturas enquanto efeitos mantêm com a causa divina da criação. A via negativa é utilizada na medida em que a perfeição pura, embora não envolva nenhuma conexão com a matéria, precisa ter a sua significação purificada do modo de ser participado, segundo o qual é apreendida nas criaturas. A seguir, tal significação deve ser superlativizada ou magnificada na via da eminência, para então poder ser atribuída afirmativa e substancialmente a Deus. No entanto, é importante ressaltar que, para Sto. Tomas, embora esses atributos pertençam mais propriamente a Deus do que as criaturas, eles não são capazes de fornecer um conhecimento do que Deus é, no sentido de que não são capazes de fornecer uma definição que expresse o que a natureza divina é, mas, apenas são capazes de empreender, de modo indireto e imperfeito, uma descrição parcial acerca do que Deus é a partir do modo com que as criaturas deficientemente O representam. Assim, quando Sto. Tomás diz que não podemos conhecer o que Deus é, está apenas dizendo que não podemos obter uma definição de Deus, mas não esta negando que se possa imperfeitamente conhecer algo acerca da sua essência. Quando diz que conhecemos antes o que Deus não é, não esta dizendo que todo o conhecimento que se obtém de Deus deva ser negativo, mas esta dizendo que, na ordem do conhecer apreendemos primeiro o que pertence às criaturas, para só depois apreender, deficientemente, aquilo que pertence a Deus. E quando diz que um nome é dito substancialmente de Deus não esta querendo dizer que ele seja capaz de significar a apreensão da substância ou essência divina, mas apenas que aquilo que está sendo significado pertence mais propriamente à natureza da Causa divina do que ao seu efeito.
Para encerrar é importante, ainda que para apenas mencionar, falar algo acerca da teoria da analogia, a qual surge no pensamento de Sto. Tomás como a tentativa de explicar o significado desses nomes que se afirmam positivamente de Deus e das criaturas, mas que significam Deus primariamente e de modo eminente. Uma vez que a causalidade divina não é unívoca e nem completamente equivoca, as similitudes com Deus não são apreendidas pelo intelecto humano sob a mesma noção, nem sob noções completamente diversas, de modo que os nomes divinos não significam nem de modo unívoco e nem de modo completamente equívoco aquilo que se está atribuindo a Deus e as criaturas. As remotas similitudes mantidas entre o efeito e a causa divina serão denominadas de similitudes analógicas e os nomes que as significam serão chamados de nomes análogos, tal significação analógica deverá ser capaz de preservar tanto um núcleo mínimo de significação comum entre Deus e as criaturas, quanto expressar a anterioridade e a eminência de tal significação no que diz respeito a Deus.

[1] Na ST, I, q2, a2, Sto. Tomás apresenta dois tipos de demonstrações, a saber, a demonstração propter quid ou per causam e a demonstração quia ou per effectum. A primeira também pode ser chamada de demonstração a priori, pois partindo do conhecimento do que é ontologicamente anterior, i.e., da causa, demonstra a existência dos efeitos e explica o seu porquê (propter quid), enquanto a segunda pode ser chamada de demonstração a posteriori, pois, quando não se possui um conhecimento direto da causa pode-se conhecê-la partindo do conhecimento do que é posterior ontologicamente, mas que é anterior para nós, i.e., gnosiolgicamente, a saber, os efeitos. Demonstra-se, assim, a existência da causa e também algumas de suas características, indiretamente, a partir de seus efeitos.
[2] “Secundum igitur quod aliquid a nobis intellectu cognosci potest, sic a nobis potest nominari”.
[3] Na ST, i, q3, Sto. Tomás prova o atributo da simplicidade divina removendo da noção de Deus todas as composições pertinentes às criaturas até remover a composição de essência e existência que é comum a toda a criatura. Ela é a composição caracteriza o ser criado geral, de tal modo que até mesmo os anjos, as criaturas mais próximas de Deus, possuem tal composição, na medida em que não são o ser subsistente por si mesmo e, como todas as criaturas, têm sua existência causada por Deus.
[4] O princípio de causalidade admitido por Sto. Tomás afirma que todo efeito deve expressar de algum modo a virtus de sua causa, em um grau inferior (causalidade equívoca) e até mesmo igual (causalidade unívoca), mas nunca superior, i.e., o efeito não pode nunca sobrepassar a virtus da causa que o produziu.
[5] Qüididade (quidditas) é um termo cunhado a partir da expressão latina quid est, que significa “que é” indicando o que uma coisa é, i.e., a sua essência conforme expressa pela definição. Assim, qüididade significa a essência de uma coisa e conhecimento qüididativo, o conhecimento da essência de uma coisa
[6] Co-naturalidade é uma noção que diz respeito à existência de uma conveniência cognitiva natural entre o sujeito que conhece e o objeto conhecido quando ambos ocupam uma mesma posição na hierarquia ontológica o mundo natural ou mundo criado, posição esta que estabelece a possibilidade do sujeito cognoscente obter naturalmente conhecimento da essência do objeto em questão. Na ST, I, q12, a4 pode-se ler que “o conhecimento de todo aquele que conhece é segundo o modo de sua natureza. Assim, se o modo de ser de uma coisa conhecida ultrapassa o modo da natureza de quem conhece, o conhecimento dessa coisa estará sem dúvida acima da natureza daquele que conhece”. Segundo o princípio gnosiológico da conaturalidade, um ser só pode obter um conhecimento qüididativo natural dos seres que lhe são co-naturais, necessitando do auxílio da graça divina para apreender a essência dos que lhe são ontologicamente superiores.
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[7] A influência da metafísica neo-platônica e da teologia de Pseudo-Dionísio na metafísica e na teologia de Aquino é notória, basta considerar as inúmeras passagens na ST em que Sto.Tomás faz referência ou cita o “beato Dionísio”. Para um estudo do procedimento da assimilação crítica efetuada por Aquino sobre o corpus areopagiticum ver O’ ROURQUE, Fran; Pseudo-Dionysius and The Metaaphysics of Aquinas.
[8] Na ST, I, q13, a2 Aquino apresenta dois grupos de teólogos que pretenderam reduzir a significação dos nomes divinos ou a uma interpretação negativa ou a uma interpretação causal, e o único teólogo que tem o seu nome mencionado é o rabino Moisés Maimônides. Sto. Tomás situa o rabino entre os defensores da via negativa como via exclusiva para se falar acerca da essência de Deus, portanto, negando a possibilidade de um discurso positivo acerca de Deus.
[9] De modo geral perfeição, nesse contexto teológico, significa toda e qualquer qualidade ou determinação ontologicamente positiva do mundo criado, enquanto imperfeição significa privação ou limite daquilo que é ontologicamente positivo. Enquanto efeitos de Deus as perfeições de algum modo revelam o que Deus é, enquanto as imperfeições revelam o que Deus não é. Há também uma distinção clássica entre perfeição pura e perfeição mista. Perfeição pura denominada a perfeição cuja noção não inclui nenhum vínculo necessário com a finitude e as limitações próprias da criatura, enquanto que perfeição mista denomina aquela perfeição cuja noção implica finitude e alguma limitação própria da criatura, notadamente a materialiadade. Encontramos essa distinção na ST, I, q13, a3, ad1, embora Sto. Tomás não se valha da terminologia pura ou mista. Sto. Tomás fala dos nomes que significam perfeições incluindo o modo imperfeito com que são participadas pela criatura e dos nomes que as significam absolutamente, sendo que os primeiros só podem ser atribuídos metaforicamente de Deus, enquanto os segundos podem ser atribuídos literalmente.